O desenvolvimento do conceito de cultura é importante
para a compreensão do paradoxo da enorme diversidade cultural da espécie
humana. O dilema da espécie está entre sua unidade biológica e sua diversidade
cultural.
“A natureza dos homens é a mesma, são os seus hábitos
que os mantém separados”. (Confúcio, séc. IV a.C.)
Monogenismo: Doutrina antropológica segundo a qual todas as raças
humanas procedem de um tipo primitivo único.
Montaigne (1533-1572) - “ Na verdade, cada qual
considera bárbaro o que não se pratica em sua terra”.
1. Determinismo
biológico:
“Para a antropologia, as diferenças genéticas não são
determinantes das diferenças culturais”.
As diferenças genéticas hereditárias não constituem um
fator de importância primordial entre as causas das diferenças culturais e
civilizatórias dos diversos povos ou grupos étnicos. É a história cultural de
cada grupo que explica essas diferenças.
Não é a racionalidade biológica (determinismo
biológico) que determina as diferenças de comportamento entre homens e
mulheres, mas a cultura. O comportamento é o resultado de aprendizado, o
processo de endoculturação. Comportamentos diferentes são o resultado de
educação diferenciada.
2. determinismo
geográfico:
As diferenças do ambiente físico condicionam a
diversidade cultural? Há uma limitação na influência geográfica sobre os
fatores culturais. É possível existir uma grande diversidade cultural
localizada em um mesmo tipo de ambiente físico.
Como conclusão podemos afirmar que as diferenças entre
os homens não podem ser explicadas pelos determinismos biológico e/ou
geográfico.
O homem rompeu com suas limitações, por isso difere
dos outros animais por ser o único que possui cultura. Mas o que é cultura?
Vejamos alguns
antecedentes históricos do conceito de cultura:
Edward Tylor (1832-1917): Kultur (alemão), significa
todos os aspectos espirituais de uma comunidade. Civilization (inglês),
significa as realizações materiais de um povo. Culture (inglês), em seu amplo
sentido etnográfico é este todo complexo que inclui conhecimentos, crenças,
arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábito adquirido
pelo homem como membro de uma sociedade.
Kroeber
escreveu o artigo: “O Superorgânico” (in American Antropologist, vol. XIX, Nº
02, 1917).
Kroeber rompeu os laços entre o cultural e o
biológico, postulando a supremacia da cultura em detrimento da biologia. O
homem é diferente dos demais animais por dois motivos: 1º) A possibilidade da
comunicação oral. 2º) A capacidade de fabricação de instrumentos capazes de
tornar mais eficiente o seu aparato biológico. Assim, o homem é o único ser
possuidor de cultura.
O
desenvolvimento do conceito de cultura:
Para Edward Tylor a cultura pode ser objeto de um
estudo sistemático, pois trata-se de um fenômeno natural que possui causas e
regularidades, permitindo um estudo objetivo e uma análise capazes de
proporcionar a formulação de leis sobre o processo cultural e a evolução.
Considerava as considerações metafísicas e teológicas sobre a natureza humana
obstáculos para a investigação das leis da natureza humana. Defendia que causas
naturais e definidas determinam as ações humanas. Preocupava-se com a
diversidade cultural e com a igualdade existente na humanidade. A diversidade
para Tylor é o resultado da desigualdade de estágios existentes no processo de
evolução. Uma das tarefas da antropologia seria estabelecer uma escala de
civilização, onde de um lado (extremo ou limite) estariam as nações européias,
do outro lado (extremo ou limite) estariam as tribos selvagens. Esta concepção
estava dentro do contexto da Origem da Espécies de Charles Darwin com seu
evolucionismo unilinear.
A ideia geral de que a cultura se desenvolve de
maneira uniforme teve como resultado uma escala evolutiva discriminatória
(etnocentrismo europeu ocidental).
Stocking (1968): Criticou Tylor por deixar de lado
toda a questão do relativismo cultural, o fato de não reconhecer os múltiplos
caminhos da cultura.
Franz
Boas (1858-1949): Atribui à antropologia duas tarefas: A reconstrução da
história dos povos ou regiões particulares e a comparação da vida social de
diferentes povos, cujo desenvolvimento segue as mesmas leis. É considerado o
pai do particularismo histórico (escola cultural americana), o qual preconiza
que cada cultura segue os seus próprios caminhos em função dos diferentes
eventos históricos que enfrentou (abordagem multilinear da teoria da
evolução).
Alfred Kroeber (1876-1960): Defende as seguintes
idéias (dentre outras) em seu artigo “O Superorgânico”: a cultura atua sobre o
homem.
Graças à cultura a humanidade distanciou-se do mundo animal.
Graças à cultura a humanidade distanciou-se do mundo animal.
O homem é um ser acima de suas limitações orgânicas. Embora
as funções vitais sejam comuns a toda a humanidade, a maneira de satisfazê-las
varia de uma cultura para outra. Há uma grande variação em um número pequeno de
funções vitais (diversidade cultural).
A herança genética não tem nada a ver com as ações e
pensamentos.
Todos os atos humanos dependem inteiramente de um processo de aprendizado. O homem criou o seu próprio processo evolutivo.
Todos os atos humanos dependem inteiramente de um processo de aprendizado. O homem criou o seu próprio processo evolutivo.
Nenhum outro animal tem toda a terra como o seu
habitat, apenas o homem conseguiu esta proeza.
Superando o orgânico, o homem de certa forma
libertou-se da natureza.
O homem ao adquirir cultura perdeu a propriedade animal, geneticamente determinada, de repetir os atos de seus antepassados. O homem adaptou-se ao meio.
O homem ao adquirir cultura perdeu a propriedade animal, geneticamente determinada, de repetir os atos de seus antepassados. O homem adaptou-se ao meio.
Há uma crença popular de que as qualidades são mais ou
menos adquiridas graças à transmissão genética. Exemplo: “Tenho a física no
sangue”. (frase dita por alguém porque o seu avô era físico); “tenho jeito para
a música”. (Frase dita por alguém porque seu pai é músico).
Cesare Lombroso (1835-1909): Criminalista italiano que
relacionou a aparência física com tendência para comportamentos criminosos (foi
considerada verdade científica e justificativa para as diferenças raciais). O
resultado foi discriminações raciais e sociais.
O homem é o resultado do meio cultural em que foi
socializado.
A manipulação criativa do patrimônio cultural é que permite as inovações e as invenções.
Não basta a natureza criar indivíduos altamente inteligentes, é necessário colocar ao alcance desses indivíduos o material que lhes permita exercer a sua criatividade de uma maneira revolucionária.
A manipulação criativa do patrimônio cultural é que permite as inovações e as invenções.
Não basta a natureza criar indivíduos altamente inteligentes, é necessário colocar ao alcance desses indivíduos o material que lhes permita exercer a sua criatividade de uma maneira revolucionária.
A cultura é um processo acumulativo, resultante de
toda a experiência histórica das gerações anteriores. Este processo limita ou
estimula a ação criativa do indivíduo.
A existência do homem depende tanto da invenção do
arco e da frecha como de outras tecnologias modernas. (Sem as suas primeiras
invenções ou descobertas, hoje consideradas modestas, não teriam ocorrido as
demais).
Nem todos os instintos humanos foram suprimidos.
Exemplo: o bebê que busca o seio materno e suga por instinto. Porém, muito
cedo, tudo o que a criança fizer não será determinado por instintos, mas pela
imitação dos padrões culturais da sociedade em que vive. Enquanto os instintos
têm uma uniformidade, os padrões culturais têm diversidade.
Tudo o que o homem faz, aprendeu com os seus
semelhantes e não decorre de imposições originadas fora da cultura.
Através da comunicação oral a criança vai recebendo
informações sobre todo o conhecimento acumulado pela cultura em que vive
(Observação e invenção). Uma criança e um bebê chimpanzé agem iguais até um ano
de vida, depois desta idade agem completamente diferente. O que falta ao
chimpanzé não é a capacidade de observação e invenção, mas a capacidade de
comunicação.
A comunicação é um processo cultural. A linguagem
humana é um produto da cultura, que depende de um sistema articulado de
comunicação oral.
Ideia sobre a
origem da cultura:
Como o homem adquiriu este processo extra somático
denominado de cultura que o diferenciou de todos os animais e lhe deu um lugar
privilegiado no planeta?
Isso se deu
devido a alguns fatores, tais como:
Cérebro modificado.
Visão tridimensional.
Utilização das mãos (habilidade manual).
Bipedismo (posição ereta).
Desenvolvimento da inteligência humana.
Cérebro mais volumoso e complexo.
Claude Lévi-Strauss afirma que a cultura surgiu no
momento que o homem convencionou a primeira regra, a primeira norma (a
proibição do incesto).
Leslie White afirma que a passagem do estado animal
para o humano ocorreu quando o cérebro do ser humano foi capaz de gerar
símbolos. Para ele toda cultura depende de símbolos. White afirma que “é o
exercício da faculdade de simbolização que cria cultura e o uso de símbolos que
torna possível a sua perpetuação. Sem o símbolo não haveria cultura, e o homem
seria apenas animal, não um ser humano. O comportamento humano é o
comportamento simbólico. Uma criança do gênero Homo torna-se humana somente
quando é introduzida e participa da ordem de fenômenos super-orgânicos que é a
cultura. E a chave deste mundo, e o meio de participação nele, é o símbolo”.
“Todos os símbolos devem ter uma forma física, pois do
contrário não podem penetrar em nossa experiência, mas o seu significado não
pode ser percebido pelos sentidos. Ou seja, para perceber o significado de um
símbolo é necessário conhecer a cultura que o criou”. (L. White)
Segundo estas opiniões, a cultura apareceu de repente,
num dado momento, como um verdadeiro salto da natureza para a humanidade. Isso
não difere muito da posição da Igreja Católica Apostólica Romana quando afirma
que “o homem adquiriu cultura no momento em que recebeu do Criador uma alma
imortal, a qual foi atribuída ao primata no momento em que Deus considerou que
o corpo do mesmo tinha evoluído organicamente o suficiente para tornar-se digno
de uma alma e, consequentemente, de cultura”.
A ciência diz que a natureza não age por saltos
repentinos, e que o salto da natureza para a cultura foi contínuo e
incrivelmente lento.
O homem não é apenas o produtor da cultura, mas
também, num sentido especificamente biológico, o produto da cultura. A cultura
desenvolveu-se simultaneamente com o próprio equipamento biológico que
caracteriza a espécie humana, ou seja: bipedismo, volume cerebral, uso das mãos
e cultura.
Chico de Oliveira (2º aula do 1º ano do ensino médio)