A “vontade
geral” de Rousseau não
é idêntica à vontade da maioria ou até à da totalidade dos cidadãos.
Rousseau entende a “vontade geral” como a
vontade do corpo político que se assume arbitrariamente como intérprete da
vontade do povo, na medida em que Rousseau considera a sociedade civil como uma pessoa e com atributos de uma
personalidade ― tal como Hobbes ―
que inclui o atributo da vontade.
Segundo Rousseau,
a sociedade civil não
é (ou não deve ser) um conjunto de indivíduos organizados,
mas antes uma pessoa coletiva.
Segundo Rousseau, o que interfere com a
expressão da “vontade geral” é a existência de “associações
subordinadas” ― ou seja, comunidades da sociedade civil ―
dentro do Estado.
Segundo Rousseau, cada uma delas quer ter a sua vontade geral, que
pode ser oposta à da comunidade como um Todo. Escreve Rousseau:
»Pode dizer-se não que
há tantos pareceres como homens, mas tantos como associações. (…) é, portanto,
essencial, se a vontade geral pode exprimir-se, que não
haja sociedades
parciais dentro do Estado, e cada cidadão pense apenas por si; tal é o sublime
e único sistema estabelecido pelo grande Licurgo«.
A consequência prática ― e se
levadas até ao limite delas ― das ideias de Rousseau são as de que o
Estado teria que proibir as igrejas ― exceto a igreja do Estado, que no caso
português é cada vez mais a Maçonaria ―, proibir partidos políticos, sindicatos
e todas as organizações de homens com interesses econômicos e/ou políticos
semelhantes. O resultado seria obviamente o Estado corporativista e/ou
totalitário, em que o cidadão nada pode, isto é, em nome do diálogo direto
entre o cidadão, entendido como indivíduo isolado, por um lado, e o Estado, por
outro lado, Rousseau condena assim o cidadão à subordinação impotente inerente
ao anonimato total.
O conceito negativo de democracia, segundo
Rousseau, tem além do mais, uma outra particularidade: ele baseia-se na
democracia da cidade-estado grega, e particularmente na democracia de Esparta
em antagonismo com a democracia de Atenas. Porém, Rousseau diz que a
democracia direta é de realização impossível porque o povo não pode estar
sempre reunido para deliberar sobre os negócios públicos. Escreve
Rousseau:
“Se
o povo fosse composto por deuses, o governo seria democrático. O governo
perfeito não é para os homens”.
Em consequência, aquilo a que os verdadeiros democratas
chamam de “democracia”, Rousseau e os seus herdeiros ideológicos, chamam de “aristocracia eletiva”, que ele quer dizer o melhor governo, mas que não é possível em todos os
países:
O
clima não deve ser nem muito quente nem muito frio; a produção não deve exceder
muito o necessário porque senão o demônio do luxo é inevitável; e o melhor é
confinar a “aristocracia eletiva” ao controlo de uma elite política, do que
difundir a democracia na população.
Com tais limitações estabelecida por
Rousseau para aquilo que ele entende por democracia, há largo campo aberto a um
governo despótico.
O Contrato Social foi a
"bíblia" da maioria dos chefes da Revolução Francesa ― incluindo Robespierre que era
amigo íntimo de Rousseau ―, mas como é a sorte das bíblias, não foi bem lido e
ainda menos compreendido por muitos discípulos: a sua teoria da “vontade geral”
tornou possível a identificação mística do chefe com o povo, o que levou ao
caudilhismo que não precisa de ser confirmado por coisa tão mundana como a urna
de voto.
Hegel seguiu
Rousseau para formatar a autocracia prussiana que levou à primeira grande
guerra. Robespierre reinou segundo os princípios de Rousseau, e segundo este
foram também formatados os princípios de afirmação política dos jacobinos. As ditaduras
russas e alemã do século passado ― principalmente a última ― foram um rebento
de ensino de Rousseau.
(Aula do 3º ano Ensino médio)