Émile Durkheim: coesão e Fato social
Émile Durkheim nasceu em 1858, na França. Influenciado pela obra do filósofo francês Augusto Comte (1798-1857), que sistematizou pela primeira vez a Sociologia como ciência específica, aproximando-a dos métodos das ciências naturais, Durkheim procurou consolidar a Sociologia como ciência social distinta das ciências naturais. Com esse objetivo, preocupou-se em desenvolver uma teoria e um método de análise com conceitos específicos para o estudo da vida em sociedade. Como veremos a seguir, os fundamentos da sociologia de Durkheim podem ser resumidos nos conceitos de coesão, de divisão do trabalho (ou especialização do trabalho) e de fato social.
Assim falou... Durkheim
[...] a divisão do trabalho [...] não serviria apenas para dotar nossas sociedades de luxo, invejável talvez, mas supérfluo; ela seria uma condição de existência da sociedade. Graças à divisão do trabalho, ou pelo menos por seu intermédio, se garantiria a coesão social; ela determinaria os traços essenciais da constituição da sociedade. Por isso mesmo [...] caso seja essa realmente a função da divisão do trabalho, ela deve ter um caráter moral, porque as necessidades de ordem, de harmonia e de solidariedade social são geralmente consideradas morais.
Lembrando o que vimos no primeiro item deste capítulo, Durkheim foi particularmente influenciado pelos desdobramentos históricos dos séculos XVIII e XIX. A Europa do século XIX desenvolveu-se em torno dos preceitos da Revolução Industrial e da Revolução Francesa. A Revolução Industrial, iniciada em meados do século XVIII, intensificou brutalmente a produção de mercadorias. Valendo- se dos avanços tecnológicos introduzidos nas fábricas, a produção industrial na Inglaterra do século XVIII se expandiu para outros países no século XIX, tornando- se o centro de organização da vida social.
Já a Revolução Francesa, que teve seu desfecho em 1789, foi marcada por transformações políticas estruturais. A sociedade feudal, que precedeu a sociedade capitalista, foi destruída. As instituições políticas feudais deram lugar às organizações políticas capitalistas. A monarquia foi substituída por instituições políticas que tinham como fundamento os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade.
As escolas, antes controladas pela Igreja, passaram às mãos do Estado, tornando-se laicas. A livre-iniciativa (o processo de trocas mercantis) foi estimulada por novas regras e leis criadas sob a ótica da produção industrial, em franco crescimento.
No fim do século XIX, Durkheim observava esse acelerado processo de transformação social, singularmente impulsionado pela indústria, e tentava responder à seguinte questão: como pode a sociedade capitalista, que se divide e se especializa em funções cada vez mais heterogêneas, garantir uma unidade, uma coesão social? Em busca de uma explicação sociológica para essa dinâmica, Durkheim procurava entender a unidade social em um mundo cada vez mais dividido pela especialização do trabalho. Ele se perguntava como indivíduos tão diferentes, em funções sociais tão distintas, poderiam se integrar socialmente.
Para explicar esse processo de diferenciação, Durkheim partiu da seguinte hipótese: todas as sociedades se caracterizam por algum tipo de divisão (especialização) do trabalho. Ou seja, ao longo do desenvolvimento das sociedades, os indivíduos tendem a se tornar cada vez mais diferentes uns dos outros. Em sociedades com menor divisão do trabalho, os indivíduos são mais semelhantes entre si quando comparados aos que pertencem a sociedades em que a divisão do trabalho é maior.
É nessa perspectiva que Durkheim observa a coesão social, ou seja, o grau de integração de cada sociedade. Em sociedades que desenvolveram muito a divisão do trabalho predomina uma dinâmica dupla. Ao mesmo tempo que ocorre uma diferenciação profissional, cria-se uma interdependência funcional entre os indivíduos. Os laços sociais, a rede de interdependência, caracterizam uma forma de coesão social. Em sociedades que desenvolveram menos a divisão do trabalho, são as crenças que garantem a unidade social, já que o processo de especialização das funções profissionais ainda é rudimentar.
Para esclarecer melhor, podemos comparar duas sociedades: uma sociedade feudal e uma sociedade industrial. Em uma sociedade feudal hipotética, a divisão do trabalho se dá com base em atividades predominantemente agrícolas. Os servos trabalham na maior parte do mês em benefício do senhor feudal e reservam apenas uma pequena parte do seu tempo para prover sua subsistência e a de sua família. As técnicas de trabalho são rudimentares e as tarefas estão ligadas ao plantio, à colheita e ao cuidado com os animais. Há grande semelhança entre as técnicas produtivas empregadas nos diferentes feudos, não havendo, assim, muita diferenciação entre os indivíduos.
Já na sociedade industrial, ocorre uma intensa divisão do trabalho: mulheres e homens exercem funções extremamente diferenciadas. Existem faxineiros, pedreiros, carpinteiros, publicitários, professores, operários, comerciantes, só para citar um pequeno número de profissões, e dentro dessas profissões ainda há várias subdivisões. Entre os professores, por exemplo, estão os que ensinam Matemática, Física, Sociologia, Antropologia, Biologia, Arte, Educação Física, etc. Para Durkheim, essas sociedades são mais especializadas, têm maior grau de divisão profissional, o que acaba por caracterizar indivíduos muito diferenciados entre si.
A divisão do trabalho é, para Durkheim, o elemento social que impulsiona o desenvolvimento das sociedades. As funções sociais são fundamentais para sua análise, e, por isso, a Sociologia desse autor foi considerada “funcionalista”. Esse foi o aspecto que influenciou os antropólogos que estudamos no capítulo 2. Entretanto, para refletir sobre a divisão do trabalho, Durkheim desenvolveu outros conceitos importantes. Entre eles, o conceito de fato social, essencial para definir o que é próprio ou não do campo sociológico.
Com o objetivo de criar conceitos com o maior rigor possível, Durkheim entendia o fato social como uma coisa, um fenômeno tão apreensível quanto qualquer elemento físico ou biológico. Os fatos sociais seriam, assim, formas de pensar, sentir e agir que exercem uma força externa (uma coerção) sobre os indivíduos.
Para Durkheim, a sociedade precedia os indivíduos e agia sobre eles, determinando suas formas de ser. Assim, um fato social poderia ser reconhecível com base na coerção social imposta a um ou mais indivíduos. Levando isso em conta, só seria considerado fato social o fenômeno que apresentasse:
1. uma generalidade (que estivesse presente e fosse reconhecível em toda uma sociedade ou grupo social);
2. uma externalidade (que fosse exterior às consciências sociais, isto é, que existisse independentemente da vontade e dos anseios do indivíduo); e
3. uma força coercitiva externa aos indivíduos, moldando as vontades individuais ao coletivo. Nesse sentido, a sociologia de Durkheim, além de funcionalista, é também considerada estruturalista, na medida em que a sociedade (a estrutura social) determinaria as condutas individuais.
Atividade:
1º) Émile Durkheim
procurou consolidar a Sociologia como ciência social distinta das ciências
naturais e resumiu os fundamentos para os estudos sociológicos. Em que?
a)
Classe social,
coesão social e divisão do trabalho;
b)
Família, divisão
do trabalho e coesão social;
c)
Coesão,
divisão do trabalho e fato social;
d)
Fato social, família
e classe social.
2º) Coesão
social é um termo da Sociologia que representa política de cooperação que reúne
e analisa ações nas áreas social, econômica e territorial impostas sob determinado
regulamento. Entre os termos abaixo qual contribui mais para a coesão?
a)
Divisão
do trabalho;
b)
Classes social;
c)
Salário mínimo;
d)
Liberalismo.
3º) Revolução
Francesa, que teve seu desfecho em 1789, foi marcada por transformações
políticas estruturais e, entre elas, a monarquia foi substituída por
instituições políticas. Quais eram os fundamentos dessas instituições?
a)
Manter os privilégios dos nobres;
b)
Ser contra o liberalismo;
c)
Prezar por decisão de uma corte;
d)
Defender ideais de
liberdade, igualdade e fraternidade.
4º) Um fato social pode ser reconhecível
com base na coerção social imposta a um ou mais indivíduos. O que não pode ser
levado em conta na classificação do fato como social?
a)
Uma Generalidade;
b)
Uma individualidade;
c)
Uma externalidade
d)
Uma força
coercitiva externa aos indivíduos
Sociologia hoje: volume único: ensino médio /Igor José de Renó Machado… [et al.]. – 1. ed. –São Paulo: Ática, 2013.