23 de out. de 2017

1º aula - 4º bimestre 3º ano Ensino Mádio

UMA NOVA VISÃO DO PODER
                Esta unidade começou com uma discussão sobre o poder, um dos conceitos fundamentais da reflexão sobre política. Como outros conceitos das Ciências Sociais (e das ciências em geral), a concepção de poder teve diferentes interpretações ao longo do tempo. Um dos principais autores que ofereceram novas maneiras de estudar o poder foi o filósofo francês Michel Foucault (1926-1984).
                A grande inovação de Foucault foi mudar o foco dos estudos sobre poder. Na maioria dos trabalhos de Ciência Política, a discussão sobre poder e política se deu em torno do Estado, do governo, dos grupos que pretendem conquistar o governo (como os partidos políticos) ou influenciar suas decisões (como os movimentos sociais), ou das relações entre os Estados (como nos estudos de Relações Internacionais). Foucault propôs outro foco: além dos temas tradicionais, estudar o poder nos hospícios, nas prisões, na maneira pela qual a sociedade regula a sexualidade das pessoas, no modo como o poder e o saber científico se relacionam. Seu trabalho gerou novos temas de pesquisa, que têm sido intensamente explorados.
                Para Foucault, na sociedade moderna o poder não é exercido apenas por “pessoas que mandam em pessoas”, como os reis mandavam em seus súditos. Nesse caso, o poder é relativamente simples: uma pessoa diz o que a outra deve fazer, ou a proíbe de fazer o que quer. Na sociedade moderna, o quadro é muito mais complexo: o exercício do poder é mais sutil, não está ligado apenas à repressão, mas também ao conhecimento técnico, aos arranjos entre as instituições e à maneira como entendemos nossa vida e nos cuidamos.
                Uma maneira de observar o exercício do poder na sociedade moderna é analisar como o crime é punido e administrado. Em muitas sociedades é comum que a pena para boa parte dos crimes seja um castigo corporal: chicotadas, torturas, mutilações ou mesmo a morte (em alguns casos, a morte especialmente cruel). Pense, por exemplo, no caso de Tiradentes, que lutou contra o governo colonial português (o que, do ponto de vista de Portugal, era um crime). Para Tiradentes, o inimigo era o rei de Portugal. Para o rei de Portugal, não houve dúvida sobre o que fazer após o fracasso da rebelião: Tiradentes foi condenado à morte por enforcamento, e seu corpo foi mutilado e exposto ao público.
                Ainda existe violência aberta (e, às vezes, extrema) contra presos no mundo moderno. Mas em grande parte dos países democráticos, uma punição considerada justa não deveria incluir a necessidade de violência física. O mais comum é que o condenado seja confinado em uma prisão construída e administrada para facilitar sua supervisão. Na prisão se espera que ele seja reeducado e aprenda os valores que regem a sociedade moderna. Com esse objetivo, especialistas estudam técnicas de reeducação, psiquiatras procuram tratar comportamentos considerados desviantes, cientistas desenvolvem remédios que podem alterar comportamentos violentos, etc. A violência só deveria ser aplicada quando tudo isso falha (como durante tentativas de fuga ou rebeliões).
                Comparada à tortura e à mutilação praticadas anteriormente, a prisão moderna parece menos violenta (ao menos em países em que há um mínimo de preocupação com os direitos dos presos). Mas a prisão atual também tem outra dimensão: pretende modificar o preso, torná-lo uma pessoa diferente. E isso não é opcional: é uma experiência pela qual o preso é forçado a passar.
                Isso nos leva a outra característica da concepção de Foucault: o poder não é só algo que nos impede de fazer o que queremos, é também algo que ajuda a moldar aquilo que somos. Pense, por exemplo, na mudança ocorrida nas últimas décadas na maneira de ver a sexualidade. Hoje há, sem dúvida, mais liberdade em diversas áreas da vida sexual nas sociedades ocidentais. Mas seria correto concluir que o poder desapareceu da vida sexual, que não há mais regras? Foucault diz que não: hoje é muito mais permitido mostrar o corpo, mas o corpo é intensamente regulado por padrões de beleza produzidos na mídia, é construído por especialistas em academias de ginástica e clínicas de cirurgia plástica, é vestido por especialistas em moda, tratado pela medicina, etc. Há uma administração, um governo do corpo por diferentes instituições e diferentes formas de conhecimento.
                Foucault, enfim, chamou atenção para a presença do poder em áreas da vida social em que ele não é óbvio. Além do poder estatal, exercido abertamente por meio da repressão, uma infinidade de micropoderes são exercidos nas escolas, nas empresas, nas prisões, na utilização do saber técnico (inclusive as Ciências Sociais) pelas autoridades. Esses micropoderes são exercidos de maneira muito sutil, muito impregnada nas formas do cotidiano, e afetam profundamente nossa formação e nossa experiência como indivíduos.
                A adolescência é muitas vezes vista como fase de rebeldia, de contestação dos padrões. E há alguma verdade nisso: os jovens constantemente questionam seus pais e professores, e até certo ponto isso é importante para desenvolver a capacidade de pensar por si mesmo. Entretanto, vale a pena refletir se esses jovens, ao se distanciar das formas relativamente simples de poder existentes na família (onde os pais mandam e os filhos obedecem), não correm o risco de se enredar em relações de poder mais sutis. Por exemplo, é possível que o mesmo jovem que questiona as ordens de sua família aceite sem questionar as exigências para participar de grupos sociais em sua escola (por exemplo, o grupo dos “populares”), ou normas e comportamentos referentes a vestuário, consumo e sexualidade comuns entre os jovens modernos. Ninguém defende que o jovem nunca questione a autoridade, mas é sempre bom ter em mente o risco de simplesmente passar de obediências mais simples para obediências mais complexas e nem sempre evidentes.
Atividade
1º) A grande inovação de Foucault foi mudar o foco dos estudos sobre poder. Segundo esse sociólogo o poder não é só algo que nos impede de fazer o que queremos, é também algo que ajuda a moldar aquilo que somos. O que isso nos diz?

2º) A prisão atual, além de recolher o preso, tem outra dimensão: pretende modificar o detento, torná-lo uma pessoa diferente. E isso não é opcional: é uma experiência pela qual o preso é forçado a passar. Isso significa que:

3º) Segundo a sociologia, existe a presença do poder em áreas da vida social em que ele não é óbvio. Como é exercido esse poder na sociedade?
Sociologia hoje (283 – 284): volume único: ensino médio /Igor José de Renó Machado [et al.]. 1. ed. São Paulo: Ática, 2013

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